sábado, 30 de novembro de 2013

RECORDANDO A VIAGEM ESPÍRITA DE ALLAN KARDEC, EM 1862

Adilton Pugliese

 "Dela recolhemos todos os episódios que, talvez, um dia terão o seu interesse, porquanto já pertencerão à História"
1 – Allan Kardec

O ensejo do sesquicentenário desse depoimento, podemos afirmar que a previsão do emérito Codificador do Espiritismo vem se confirmando. O detalhado relatório no qual ele deixou registrados os fatos de sua incursão ao interior da França tem atraído o interesse de vários estudiosos da Doutrina Espírita e, sobretudo, inspirado a formulação das diretrizes das atividades unificacionistas que envolvem as atividades das instituições espíritas da atualidade.

A famosa viagem foi, acima de tudo, o atendimento a um convite do Movimento Espírita que já se dinamizava na nação de Victor Hugo, especificamente nas cidades de Lyon e Bordeaux, subscrito por 500 assinaturas. Apresso-me em vos dizer o quanto sou sensível ao novo testemunho de simpatia que acabais de dar-me,2 declara Allan Kardec na carta-resposta, publicada na Revue Spirite, de setembro de 1862, solicitando que não haja banquete,2 explicando, humildemente, os motivos:

[...] Não vou a Lyon para me exibir, nem para receber homenagem, mas para conversar convosco, consolar os aflitos, encorajar os fracos, ajudar-vos com os meus conselhos naquilo que estiver em meu poder fazê-lo.[...]2

No término da carta despede-se, gentil:Até breve, meus amigos; se Deus quiser terei o prazer de vos apertar as mãos cordialmente.2

Dentre outros acontecimentos, 1862 também fora o ano em que Allan Kardec recebeu da Sociedade Espírita Caridade, de Viena, Áustria, em sessão de aniversário de 18 de maio, o diploma e o título de Presidente Honorário, concedido, por aclamação, ao digno e corajoso presidente da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas[SPEE].1
A viagem duraria sete semanas, nos meses de setembro e outubro de 1862. Allan Kardec visitaria 20 cidades, saindo de Paris: Provins, Troyes, Sens, Lyon, Avignon, Montpellier, Cette, Toulouse, Marmande, Albi, Sainte-Gemme, Bordeaux, Royan, Meschers-sur-Garonne, Marennes, St.-Jean dAngély, Angoulême, Tours e Orléans,3 deslocando-se através da malha ferroviária francesa por 693 léguas (4.600 km aprox.), assistindo a mais de 50 reuniões.

Era a terceira viagem que ele realizava para disseminar o conhecimento espírita e estabelecer diretrizes administrativas e organizacionais para o Movimento doutrinário nascente.
Em comunicação recebida,por via mediúnica, em 1º de agosto de 1862, na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, o Espírito Santo Agostinho, pelo médium Sr. E. Vézy, comenta acerca das próximas férias da Instituição, estimulando, contudo, os presentes à reunião, dentre eles Kardec, que o recesso fosse operativo, dizendo a todos:
Capa do livro publicado pela
FEB Editora e frontispício da
primeira edição

Aproveitai estas férias que vão espalhar-vos, para vos tornardes ainda mais fervorosos, a exemplo dos apóstolos do Cristo [...].4 (Grifo nosso.) Allan Kardec seguiria o conselho à risca, aproveitando, sobretudo,o convite recebido dos espíritas lioneses e bordeleses, e planeja, estrategicamente, a utilização daquele período – que poderia ser dedicado ao lazer, ao repouso e à ociosidade – à famosa viagem histórica.

Redige, então,imediatamente, uma Nota a todos os centros espíritas que deveria visitar, publica-a na Revista Espírita,3 declarando que buscaria aproveitar o melhor tempo possível para instrução das instituições, e responde a perguntas sobre as quais desejassem esclarecimentos. Sem embargo, nessa iniciativa do Codificador estão os pilotis do valioso trabalho realizado pela FEB por meio das reuniões anuais do Conselho Federativo Nacional (CFN), do Conselho Espírita Internacional (CEI) e das Comissões Regionais. Podemos incluir, nesse esforço doutrinário-orientador, o incansável labor realizado pelo médium Divaldo Franco, no Brasil e no Exterior.

Em 1862, portanto, Kardec retornaria a Lyon e a outras mais 19 cidades. Era outono, férias de verão da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, a SPEE. O Espiritismo completava o seu 5º aniversário, desde a data magna de 18 de abril de 1857,com o lançamento da pedra fundamental do edifício doutrinário: O Livro dos Espíritos e também de O Livro dos Médiuns, em 15 de janeiro de 1861.

 Allan Kardec planeja cuidadosamente o périplo, tendo em vista que o esperavam vários encontros com dirigentes e adeptos da novel Doutrina. Nas suas Impressões Gerais, constantes do opúsculo Voyage Spirite en 1862, ele declara que já constatara, na primeira ida a Lyon, em 1860, a existência de no máximo algumas centenas de adeptos;5 em 1861, ao retornar, identificara de cinco a seis mil,5 e naquela nova viagem podia avaliá-los entre vinte e cinco e trinta mil.5

 Lançando as primeiras sementes dos futuros encontros de Unificação, que há mais de um século são promovidos pela Federação Espírita Brasileira e pelas Federativas Estaduais, Allan Kardec realizou Reuniões Gerais com a  participação dos espíritas de Lyon e de Bordeaux, pronunciando discursos de avaliação e instruções particulares em resposta a algumas perguntas que lhe foram dirigidas.5

 Após a viagem, emitiria nota na Revue Spirite, de novembro de 1862 (ano V, n. 11), declarando ser longo o relato de tudo o que acontecera e que publicaria um livreto à parte6 (Voyage Spirite en 1862), que já se encontrava no prelo, em formato de brochura, contendo, em síntese:
 1.As observações sobre o estado do Espiritismo;7
 2.As instruções dadas por Allan Kardec nos diferentes grupos;7
 3. As instruções sobre a formação dos grupos e das sociedades, e um modelo de regulamento para o uso deles e delas.7
 Relendo, um século e meio depois, os históricos textos da lavra do mestre do Espiritismo, facilmente deduzimos porque ele foi escolhido por Jesus para liderar a nobre missão de concretizar a sua promessa da vinda do Consolador.

 Do relato apresentado, após o seu retorno, extraímos destaques importantes nos três discursos pronunciados por Allan Kardec:
 I. A caracterização dos verdadeiros espíritas, os espíritas cristãos: Os que aceitam para si mesmos todas as consequências da Doutrina, e que praticam ou se esforçam por praticar a sua moral;8
 II. Ele [o Espiritismo] agrada: 1) Porque satisfaz à aspiração instintiva do homem quanto ao futuro; 2) Porque apresenta o futuro sob um aspecto que a razão pode admitir; 3) Porque a certeza da vida futura faz com que o homem  sofra sem se queixar das misérias da vida presente; [...] 6) Porque todas as máximas dadas pelos Espíritos tendem a tornar melhores os homens uns para com os outros.8
III. Se o Espiritismo é uma verdade, se deve regenerar o mundo, é porque tem por base a caridade. Ele não vem derrubar os cultos nem estabelecer um novo; proclama e prova verdades comuns a todos, base de todas as religiões, sem se preocupar com detalhes. Não vem destruir senão uma coisa: o materialismo, que é a negação de toda religião [...].8
 No capítulo Instruções Particulares dadas aos Grupos...Allan Kardec transcreve oito respostas dadas por ele a questões propostas pelos participantes dos encontros. No  terceiro parágrafo, o Codificador destaca ser o Espiritismo invulnerável sob a égide de sua sublime moral,9 enfatizando: Em caso de incerteza tendes um farol que não vos pode enganar: a caridade, que nunca é equívoca.9 (Grifo do original.)
 Não seria desejável que os espíritas tivessem uma senha, um sinal qualquer para se reconhecerem quando se encontram?,9 questionaram membros dos grupos reunidos. Allan Kardec, consciente do papel dos adeptos da Terceira Revelação, por ele mesmo designados espíritas ou espiritistas, consoante consignou na Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita em O Livro dos Espíritos, item I, responde:
Os espíritas não formam nem uma sociedade secreta, nem uma afiliação; não devem, pois, ter nenhum sinal secreto para serem reconhecidos. [...] Tendes uma senha que é compreendida de um extremo a outro do mundo: é a da caridade. [...] Pela prática da verdadeira caridade reconhecereis sempre um irmão, ainda que não seja espírita, e deveis estender-lhe a mão [...].9

 No Projeto de Regulamento para uso dos Grupos e Pequenas Sociedades Espíritas,10 confirma os seus sentimentos cristãos e a sua comovedora vinculação com o Cristo, ao propor, como divisa das instituições espíritas que se alastrariam pelo mundo, o lema da religião espírita: Fora da Caridade não há Salvação;10 ampliando-o para: Fora da Caridade não há Verdadeiros Espíritas!10
As experiências das viagens de propaganda espírita seriam consideradas por Allan Kardec ponto estratégico para a divulgação da Doutrina e organização dos centros espíritas pioneiros e do futuro. Tanto, que insere essa iniciativa como o 4º eixo [os outros seriam criação de um (1º) Estabelecimento Central; (2º) Ensino Espírita e (3º) Publicidade em larga escala das ideias espíritas] do seu famoso e sempre atual Projeto 1868, definindo o seu objetivo: Dois ou três meses do ano seriam consagrados a viagens, para visitar os diferentes centros e lhes imprimir boa direção.11

 Sob vários pontos de vista, nossa viagem foi muito satisfatória e, sobretudo, muito instrutiva pelas observações que recolhemos, conclui Allan Kardec em suas Impressões Gerais. Declara-se feliz por ter apertado as mãos dos irmãos espíritas e de lhes ter expressado pessoalmente a sua sincera e viva simpatia, retribuindo as tocantes provas de amizade que eles transmitiam em suas cartas, e expressa, em seu nome e em nome da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, um testemunho especial de gratidão e de admiração àqueles destemidos pioneiros das primeiras alvoradas do Espiritismo na Terra.12
  
 Referências:

1MOREIL, André. Vida e obra de Allan Kardec. São Paulo: Edicel, 1986. p. 67.
2KARDEC, Allan. Aos centros espíritas que devemos visitar. Revista espírita: jornal de estudos psicológicos, ano 5,
n. 9, p. 379 e 381, respectivamente,set. 1862. Trad. Evandro Noleto Bezerra.3. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2009.
3______. Viagem espírita em 1862 e outras viagens de Kardec. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2011. Cap. Impressões gerais, p. 26.
4______. Férias da Sociedade Espírita de Paris. Revista espírita: jornal de estudos psicológicos, ano 5, n. 9, p. 392, set. 1862. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2.ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora,2009.
5______. Viagem espírita em 1862 e outras viagens de Kardec. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2011. p. 27 e 48, respectivamente.
6______. Viagem espírita em 1862. Revista espírita: jornal de estudos psicológicos,ano 5, n. 11, p. 438, nov. 1862. Trad.Evandro Noleto Bezerra. 3. ed. 2. reimp.Rio de Janeiro: FEB Editora, 2009.
 7CHIBENI, Silvio S. Sinopse dos principais fatos referentes às origens do Espiritismo – II. Reformador, ano 117, n. 2.040, p. 33(93), mar. 1999. 8KARDEC, Allan. Viagem espírita em 1862 e outras viagens de Kardec. Trad.
Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2011. p. 53, 77, 78 e 87, respectivamente.
9______. ______. p. 106, 110 e 111, respectivamente.
10______. ______. p. 142.
11______. Obras póstumas. Trad. Evandro Noleto Bezerra. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2009. Cap. Projeto – 1868, it.Viagens, p. 441.

12______. Viagem espírita em 1862 e outras viagens de Kardec. Trad. Evandro Noleto Bezerra. 2. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB Editora, 2011. Nota do Tradutor, p. 11.

Revista Reformador / Novembro, 2012 / No 2.204


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quinta-feira, 21 de novembro de 2013

BIOGRAFIA - ERNESTO BOZZANO

       Ernesto Bozzano foi um dos mais eruditos sábios dos últimos tempos. Nascido em Savona, província de Gênova, na Itália, no ano de 1861, ele veio a desencarnar em Gênova, no dia 7 de julho de 1943.
       
Dado o seu inusitado interesse pelo estudo do Espiritismo, em cujo afã dedicou metade de sua profícua existência de 81 anos, mereceu o cognome de “Grande Mestre da Ciência da Alma”. Trabalhando catorze horas diárias, durante cinqüenta e dois anos, elaborou um estudo que se fosse enfeixado num livro de tamanho médio, resultaria num volume de 15.000 páginas. Para colimar seus estudos contou com o concurso valioso de 76 médiuns, tendo ainda deixado nove monografias inconclusas.
     
  Com apenas 16 anos de idade, Bozzano já se interessava por temas abrangendo assuntos filosóficos, psicológicos, astronômicos, ciências naturais e paleontológicas. Além disso, desde a sua juventude, sentia inusitada atração para os problemas da personalidade humana, principalmente os que conduziam às causas dos sofrimentos, a finalidade e a razão da vida humana.
     
  O seu nome alcançou notável projeção internacional, tendo sido escolhido como Presidente de Honra do V Congresso Espírita Internacional, realizado em Barcelona, Espanha, de 1° a 10 de setembro de 1934.
       
Conforme notícia estampada no famoso jornal inglês Two Worlds, em sua edição de maio de 1939, os espíritas britânicos ofereceram-lhe belíssima medalha de ouro, tendo em uma de suas faces uma figura simbólica segurando uma coroa de louro na mão direita, com a divisa latina Aspera ad Astra, e na outra face uma legenda cuja tradução é a seguinte: “Ao Grande Mestre da Ciência da Alma, Ernesto Bozzano, que abriu novos horizontes à humanidade sofredora, seus amigos e admiradores.”
       
Bozzano foi intransigente defensor do Espiritismo, tendo tomado a incumbência de tamanha relevância após estudá-lo minuciosamente.
     
  Numa época em que o Positivismo de Augusto Comte empolgava muitas consciências, Bozzano passou a engrossar suas fileiras, demonstrando nítida inclinação por todos os ramos do saber humano e entregando-se resolutamente ao estudo das obras dos grandes filósofos de todas as épocas. Dos postulados positivistas gravitou para uma forma intransigente de materialismo, o que o levou a proclamar, mais tarde: “Fui um positivista-materialista a tal ponto convencido, que me parecia impossível pudessem existir pessoas cultas, dotadas normalmente de sentido comum, que pudessem crer na existência e sobrevivência da alma.”
    
   Nos idos de 1891, recebeu do professor Ribot, diretor da Revista Filosófica, a informação sobre o lançamento da revista Anais das Ciências Psíquicas, dirigida pelo Dr. Darieux, sob a égide de Charles Richet. A sua opinião inicial sobre essa publicação foi a pior possível, dada a circunstâncias de considerar verdadeiro escândalo o fato de representantes da Ciência oficial levarem a sério a possibilidade da transmissão do pensamento entre pessoas que vivem em continentes diferentes, a aparição de fantasmas e a existência das chamadas casas mal-assombradas.
      
Nessa mesma época, o professor Rosenbach, de S. Petersburgo (atual Leningrado), publicou violento artigo na Revista Filosófica, situando-se numa posição antagônica à introdução desse novo misticismo no domínio da psicologia oficial. Na edição subseqüente, o Dr. Charles Richet, refutou, ponto por ponto, as afirmações de Rosenbach, as quais reputava errôneas, mostrando em seguida as suas conclusões lógicas sobre a matéria. Esse artigo do sábio francês teve o mérito de diminuir as dúvidas de Bozzano.
      
Os últimos resquícios dessa dúvida foram completamente destruídos na mente de Bozzano, quando ele leu o livro Fantasmas dos Vivos, de autoria de Gurney, Podmore e Myers. As dúvidas que alimentava sobre os Fenômenos telepáticos foram assim completamente eliminadas. Dali por diante dedicou-se, com afinco e verdadeiro fervor, ao estudo aprofundado dos fenômenos espíritas, fazendo-o através das obras de Allan Kardec, Léon Denis, Gabriel Delanne, Paul Gibier, William Crookes, Russel Wallace, Du Prel, Alexander Aksakof e outros.
       
Como medida inicial para um estudo mais profundo, Bozzano organizou um grupo experimental, do qual participaram o Dr. Giuseppe Venzano, Luigi Vassalo e os professores Enrico Morselli e Francisco Porro da Universidade de Gênova.
     
  No decurso de cinco anos consecutivos, graças ao intenso trabalho desenvolvido, esse pequeno grupo propiciou vasto material à imprensa italiana e, ultrapassando as fronteiras da península, chegou a vários países, pois praticamente havia-se objetivado a realização de quase todos os fenômenos, culminando com a materialização de seis Espíritos, de forma bastante visível e com a mais rígida comprovação.
      
O seu primeiro artigo intitulou-se Espiritualismo e Crítica Científica, porém o sábio levou cerca de nove anos estudando, comparando e analisando, antes de publicar as suas idéias. Polemista de vastos recursos, sustentou quatro acérrimas e importantes polêmicas com detratores do Espiritismo. A fim de pulverizar uma obra de ataque, publicada na época, fez editar um livro de duzentas páginas, o qual levou o título Em Defesa do Espiritismo.
      
A primeira obra por ele publicada, com o fito de sustentar a tese espírita foi a Hipótese Espírita e a Teoria Científica, à qual se seguiram outras não menos importantes: Dos Casos de Identificação Espírita, Dos Fenômenos Premonitórios, e A Primeira Manifestação de Voz Direta na Itália.
      
As seguintes obras de Bozzano foram vertidas para o português: Animismo ou Espiritismo?, Pensamento e Vontade, Os Enigmas da Psicometria, Metapsíquica Humana, A Crise da Morte, Xenoglossia, Fenômenos Psíquicos no Momento da Morte e Fenômenos de Transporte.
      
O seu devotamento ao trabalho fez com que o grande sábio italiano se tornasse de direito e de fato um dos mais salientes pesquisadores dos fenômenos espíritas, impondo-se pela projeção do seu nome e pelo acendrado amor que dedicou à causa que havia esposado e defendido com todas as forças de sua convicção inabalável.
      
Um fato novo veio contribuir para robustecer a sua crença no Espiritismo. A desencarnação da sua mãe, em julho de 1912, serviu de ponte para a demonstração da sobrevivência da alma. Bozzano realizava na época sessões semanais com um reduzido grupo de amigos e com a participação de famosa médium. Realizando uma sessão na data em que se comemorava o transcurso do primeiro aniversário de desencarnação da sua genitora, a médium escreveu umas palavras num pedaço de papel, as quais, depois de lidas por Bozzano o deixaram assombrado. Ali estavam escritos os dois últimos versos do epitáfio que naquele mesmo dia ele havia deixado no túmulo de sua mãe.
     
  Durante os anos de 1906 e 1939, Bozzano colaborou intensamente na revista espírita Luce e Ombra, escrevendo também centenas de artigos para as revistas do gênero, que se publicavam na Itália, França, Inglaterra e outros países.

Fonte: www.autoresespiritasclassicos.com.br


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sexta-feira, 15 de novembro de 2013

POR QUAL MOTIVO O MAGNETISMO SEMPRE FOI PERSEGUIDO, INCLUSIVE NA ATUALIDADE PELO MOVIMENTO ESPÍRITA, ENFRENTANDO TANTOS OBSTÁCULOS PARA SE IMPLANTAR EM DEFINITIVO NA TERRA?

Há questões simples, como existem as complexas. Tem aquelas que pensamos saber e nos confundem, tal como outras que sequer sabíamos que sabíamos… e sabíamos. Em suas “Confissões”, Santo Agostinho se questionou: “Que é, pois, o tempo? Se ninguém me pergunta, eu sei; mas se quiser explicar a quem indaga, já não sei”.
O Magnetismo, em seu surgimento moderno, deve ter disputado com a ideia de que a Terra era redonda, a primazia da contrariedade dos que se sentiam como os balizadores das essências humanas. Enquanto esta sempre termina deixando por terra as faces dos religiosos, aquele roubaria aos farmacêuticos e às Academias o poder de colar rótulos e, por isso, cobrar e fazer fortunas.

Muito provavelmente terá sido o fato do Magnetismo  ser dom natural, a cujos possuidores só se pedia ação equilibrada e vontade determinante, que o colocou numa redoma condenada ao despautério, pois seria de grande risco essa força desbancar as bancas acadêmicas e os cofres dos produtores de saúde em pílulas, injetáveis, xaropes ou encapsulados. Do Magnetismo curar doenças tidas como incuráveis, sem imputar nenhum outro medicamento além da água magnetizada, brotou violenta campanha para desacreditá-lo. E esta, ao que parece, tem vencido até os dias atuais.

Mas neste ponto entra a parte que pensamos que sabemos, mas que nenhuma lógica é suficientemente rica para explicar ou justificar.

Allan Kardec, já a partir de O Livro dos Espíritos, e estendendo-se até o último número de sua Revista Espírita, foi essencialmente claro e convincente acerca da imperiosidade de que o Espiritismo se desenvolvesse coladinho ao Magnetismo (sugiro ao leitor que ainda não o tenha feito, a leitura de meu livro Reavaliando Verdades Distorcidas, onde apresento os principais pontos em que o vínculo Espiritismo/Magnetismo é ratificado a mancheias). Mas se apenas ele tivesse se referido ao Magnetismo, poderia ser advogado que estava “puxando brasas para sua sardinha”, já que era magnetizador há 35 anos quando compôs O Livro dos Espíritos; na verdade são inúmeras as citações e referências diretas dos Espíritos acerca do Magnetismo e seu uso, o que dá total aval ao bendito consórcio Espiritismo e Magnetismo.

E o que tem isso de intrigante? Simplesmente o fato a que se refere a questão do texto: por que o Movimento Espírita cria tantos obstáculos para a implantação dessa ciência em favor da Humanidade?

Se não me perguntam esses motivos sinto que sei, mas quando me pedem para explicitá-los vejo que me faltam argumentos, posto que não há lógica, ética, sentido ou moral que os justifiquem.

Quando Jesus pronunciou “Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus” (Mateus 7:21), parece que igualmente dizia, à posteridade: “Nem todo que se diz kardecista segue Allan Kardec”. Pois se Allan Kardec orienta a busca e o uso do Magnetismo, como se estar contra ele? Será que o fato de se ser “administrador de Casa Espírita, ou mesmo de Federação”, muda a essência? Os antigos dirigentes religiosos pensaram que sim; a maioria dos atuais continua pensando igual. E Jesus assevera: “Deixai-os; são guias cegos; ora, se um cego guiar outro cego, ambos cairão no barranco” (Mateus 15:14). Porém o cego verdadeiro não é o que não vê e sim aquele que não quer ver. Só que para quem guia violando o que seria de dever e de direito, também há advertência: “Qualquer, pois, que violar um destes mandamentos, por menor que seja, e assim ensinar aos homens, será chamado o menor no reino dos céus; aquele, porém, que os cumprir e ensinar será chamado grande no reino dos céus”. (Mateus 5:19).

Certamente o leitor estará me achando muito bíblico nesta resposta, mas se minha experiência e minha vida espírita, se os meus mais de 45 anos estudando e praticando o Magnetismo e todo o resultado que vem sendo constatado em tantas Casas e junto a tantas pessoas que utilizam essa maravilha não tem valido para atestar o valor do Magnetismo em nosso meio, só mesmo buscando a palavra do Novo Testamento para tentar fazer refletir quem deveria estar “defendendo” a Codificação e o Espiritismo em si.

Não existe lógica para as desculpas esfarrapadas que dão. Já cansei de repetir que se o passe espírita fosse só imposição de mãos, oração e boa vontade, a própria razão que orientam aos passistas, recomendando-lhes estudo e aprofundamento, estaria integralmente negada. Se os chamados “passes simples” fossem suficientes, não haveria razão para tão pouco efeito em seus resultados. Se aos Espíritos coubesse mesmo tudo fazerem, eles simplesmente estariam demonstrando pouquíssima eficiência. Porém nada disso parece importar muito…

Afinal, qual a razão dos dirigentes de muitas e muitas Casas serem contra o Magnetismo? Que lógica se esconde nas mentes que dizem ou pensam dirigir o Movimento Espírita quando se posicionam contra Kardec e os Espíritos Superiores da Codificação? Certamente estarão ganhando alguma coisa com isso; só que como esse ganho não é intelectual, espiritual, moral ou educacional, qual será então?

Creio que esta é a primeira vez que escrevo para o Vórtice sem deixar clara uma posição ante o questionamento feito. Simplesmente não sei, não entendo, não concebo e nem sequer formulo hipóteses concretas acerca do assunto, pois não quero crer se tratar de uma grande, poderosa e violenta onda obsessiva que grasa nas mentes e nos corações, os quais deveriam divulgar e incentivar o Magnetismo, fosse por amor à ciência, por amor ao Espiritismo, por amor aos iniciadores, por amor a Jesus, por amor ao próximo ou apenas por fidelidade. Só não cabe mesmo é alguém se designar dirigente espírita e jactar-se de ser contra o Magnetismo. Quem sabe eles saberiam e poderiam nos explicar as razões?
Acho difícil também, pois o que eles mais semeiam é o silêncio inoperante no lugar da luz que iluminaria a todos.
Enquanto isso, continuemos estudando, aplicando, elevando o próprio Espiritismo e aproveitando as benesses do Magnetismo, pois enquanto os cães ladram, a caravana do bem segue firme com a base mais segura: Jesus e Kardec.

JACOB MELO
JORNAL VORTICE ANO VI, Nº 05 - Outubro - 2013

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

IMPOSIÇÃO DE MÃOS E PASSE

Tiago Martins dos Santos

Análise e refutação de algumas afirmações de Herculano Pires sobre a origem dos passes em “Obsessão. O Passe. A Doutrinação”

O passe espírita é simplesmente a imposição das mãos, usada e ensinada por Jesus como se vê nos Evangelhos. Origina-se das práticas de cura do Cristianismo primitivo. Sua fonte humana e divina são as mãos de Jesus. (PIRES, Herculano. Obsessão. O Passe. A doutrinação. Ed. Paidea)

Há aqui dois erros que precisam ser elucidados: (1) a questão da imposição de mãos por Jesus e os primeiros cristãos; (2) a origem dos passes no Espiritismo. É sobre o primeiro erro que desejo dedicar este escrito fundamentalmente.

Historicamente, é sabido que os passes no Espiritismo não decorrem das práticas de curas dos primeiros cristãos como afirma Herculano, mas das práticas magnéticas desenvolvidas por Mesmer. Filosoficamente é possível recuar no tempo e afirmar que os passes espíritas têm uma ligação com aqueles realizados pelos primeiros cristãos, fazendo uso da analogia. No entanto, esta ideia mascara e esconde a origem real destas práticas: Mesmer e seus discípulos.

O Espiritismo é doutrina racional fundamentada em fatos. Estabelecer que os passes espíritas decorrem das práticas dos primeiros cristãos significa afirmar a existência de uma sucessão apostólica na fluidoterapia, em que Jesus ensinou a imposição de mãos aos apóstolos, os apóstolos aos seus sucessores, estes a terceiros, assim sucessivamente até Kardec, e de Kardec aos dias de hoje. E isto é tão falso quanto uma cédula de três reais.
Conforme os fatos históricos, o que de fato ocorreu é que as práticas de cura pela ação dos fluidos magnéticos foram estudadas e reveladas ao público por Mesmer. Antes de Mesmer, a fluidoterapia era simplesmente uma ação sobrenatural que circundava alguns homens eleitos
pela Potestade Divina. Mesmer, no entanto, demonstrou que o Magnetismo é lei natural. Posteriormente, os discípulos de Mesmer sistematizaram o conhecimento magnético e vulgarizaram a sua prática.

É no contexto de difusão das práticas magnéticas que surge o Espiritismo no mundo. Um magnetizador chamado Hippolyte Léon Denizard Rivail interessa-se pelos curiosos fenômenos das mesas girantes, para ele fenômenos que, inicialmente, nada mais revelavam que um desdobramento das teorias magnéticas. Aprofundando a análise dos fatos, o Professor Rivail percebe um agente desconhecido e insuspeitado para estes fatos: os mortos! Escreve um livro chamado O Livro dos Espíritos, toma o pseudônimo de Allan Kardec e dá o pontapé inicial para a Doutrina Espírita. Não bastasse isto, este professor tem a ousadia de afirmar que a nova ciência não nascia independente da sua predecessora, mas que Espiritismo e Magnetismo formam uma única ciência (LE, questão 555).

De fato, é bonito pensar que os passes vem diretamente das mãos de Nosso Senhor Jesus Cristo, mas a verdade histórica mostra que foi um discípulo dele, Mesmer, quem revelou ao público a ciência magnética (pressuponho com base em Kardec que Mesmer era um Espírito missionário, por isto discípulo do Cristo). Como afirma Emmanuel, “nem tudo que é admirável é divino” e, portanto, verdadeiro. Uma ideia bonita sobre o passe é apenas uma ideia bonita se não está fundamentada em Kardec e no Magnetismo.

Não existe qualquer linhagem professor-discípulo em fluidoterapia desde Jesus até os dias de hoje. Sabemos que Jesus foi o maior magnetizador que o mundo conheceu, porém sabemos disto porque Mesmer, Du Potet e Kardec nos deram a conhecer o Magnetismo. Antes de Mesmer, repita-se, as curas eram milagres que aconteciam por obra de Deus, numa intervenção sobrenatural, ideia muito contrária aos postulados espíritas. Com todo respeito que Jesus nos merece, creio que nem Jesus corroboraria a afirmação de que o passe deriva historicamente Dele, pois Magnetismo é lei natural conhecida a partir de Mesmer.

Mas eu havia afirmado que desejava escrever algo sobre as imposições de mãos dos primeiros cristãos. Agora, desfeito o mal entendido quanto à origem da fluidoterapia, é possível desmitificar um pouco a questão das imposições.

Difundiu-se no Movimento Espírita, principalmente a partir das afirmações de Roque Jacintho (O passe e o Passista) e de Herculano Pires (Obsessão. O Passe. A Doutrinação), que o passe na Casa Espírita ocorre apenas pelas chamadas imposições de mãos. Esta posição é mais radical em Herculano Pires que em Roque Jacintho, porém não há como demonstrar isto neste momento.

Como um verdadeiro mantra, os espíritas repetem: “Jesus impunha as mãos, Jesus impunha as mãos, Jesus impunha as mãos”, dando a entender que qualquer um que faça diferente faz algo que o Cristo não fazia. Como afirma Kardec que Jesus é o modelo da Humanidade, qualquer um que faça diferente do mantra laboraria fora do Espiritismo, revivescência do cristianismo primitivo(aqui não há ironia).


“Uma ideia bonita sobre o passe é apenas uma ideia bonita se não está fundamentada em Kardec e no Magnetismo”.


Ao mesmo tempo em que os espíritas brasileiros repetem o mantra das imposições, eles repetem outro: “não pode tocar no paciente, não pode tocar no paciente, não pode tocar no paciente”. Pessoalmente não se pode ser a favor do toque, nem contra o toque: como uma técnica, o toque tem as suas devidas aplicações dentro da teoria magnética e da Doutrina Espírita.

É curioso como se criou no Movimento Espírita um tabu quanto ao toque, ao invés de um conhecimento lúcido sobre esta técnica.

Sem dúvida que estas criações mantrificadas, para não dizer hipnóticas, têm a sua devida razão de ser.

Que pensa Kardec do assunto?

556. Têm algumas pessoas, verdadeiramente, o poder de curar pelo simples contato?

A força magnética pode chegar até aí, quando secundada pela pureza dos sentimentos e por um ardente desejo de fazer o bem, porque então os bons Espíritos lhe vêm em auxílio. (...) (Livro dos Espíritos)

Está evidente que para a Doutrina Espírita o toque não é vetado, pois se assim fosse os Espíritos simplesmente responderiam que não se deve tocar o assistido ou, ainda, que a força magnética prescinde do toque. Ao contrário, “a força magnética pode chegar até aí”, isto é, até ao ponto “de curar pelo simples contato”, pelo toque!

Os Espíritos também poderiam afirmar que o toque é uma prática meramente ritual, mas não o fizeram. Ao contrário, se o indivíduo toca o paciente com “pureza dos sentimentos” e “ardente desejo de fazer o bem”, os Espíritos Bons ajudam no êxito da atividade curadora. E isto foram os Espíritos da Codificação que declararam a Allan Kardec.

A mesma orientação se percebe em O Livro dos Médiuns, item 175, Capítulo XIV:

Diremos apenas que esse gênero de mediunidade consiste principalmente no dom de curar por simples toque, pelo olhar ou mesmo por um gesto, sem nenhuma medicação.
Novamente, se afirma o uso do toque, agora especificamente pelo médium de cura. Como se pode perceber pela afirmação de Kardec, o toque é uma das formas de manifestação da mediunidade curadora.

Repito as palavras de Kardec quanto à mediunidade de cura: “dom de curar por simples toque”.

Não se percebe na Codificação uma vedação ao toque. O toque é reconhecido pelos Espíritos da Falange Espírito de Verdade e por Allan Kardec como técnica a ser usada tanto na ação magnética quanto na mediunidade de cura.

Transformar em dogma o que é mera conveniência não parece uma atitude adequada de quem deseja professar uma fé racional. Repetir um chavão, criar um dogma inexplicável é uma atitude possível, mas não consentânea com o Espiritismo.
Realizadas estas considerações sobre a técnica do toque, finalmente chego aonde desejava. Como o mantra das imposições é bonito e cativante, eleva a alma e acalma o espírito (se bem que perturba a inteligência), fui dedicar-me à comprovação deste dogma de fé, pesquisando os próprios Evangelhos, os textos de Lucas, Mateus, João e Marcos a fim de encontrar ali a justificação para a beleza simples das imposições de mãos. Mas, Ó Supremo desgosto, eis que encontro um Jesus que não impõe mãos, mas comete o sacrilégio de tocar nas pessoas.

E Jesus, estendendo a mão, tocou-o, dizendo: Quero; sê limpo. E logo ficou purificado da lepra. (Mateus 8:3)

E ele, estendendo a mão, tocou-lhe, dizendo: Quero, sê limpo. E logo a lepra desapareceu dele. (Lucas 5:13)

Então Jesus, movido de íntima compaixão, tocoulhes nos olhos, e logo viram; e eles o seguiram. (Mateus 20:34)

E Jesus, movido de grande compaixão, estendeu a mão, e tocou-o, e disse-lhe: Quero, sê limpo. (Marcos 1:41)

Tocou então os olhos deles, dizendo: Seja-vos feito segundo a vossa fé. (Mateus 9:29)

E tocou-lhe na mão, e a febre a deixou; e levantouse, e serviu-os. (Mateus 8:15)
E, tirando-o à parte, de entre a multidão, pôs-lhe os dedos nos ouvidos; e, cuspindo, tocou-lhe na língua. (Marcos 7:33)

E, chegando-se, tocou o esquife (e os que o levavam pararam), e disse: Jovem, a ti te digo: Levanta-te. E o defunto assentou-se, e começou a falar. (Lucas 7:14)

E, respondendo Jesus, disse: Deixai-os; basta. E, tocando-lhe a orelha, o curou. (Lucas 22:51)

E, logo que o povo foi posto fora, entrou Jesus, e pegou-lhe na mão, e a menina levantou-se. (Mateus 9:25)

As citações acima retirei do site BibliaOnline, o qual oferece várias traduções da Bíblia (Almeida, católicas, luteranas, etc.). Porém, fiz uma outra pesquisa, lendo os Evangelhos em edição da Editora Ave Maria e as conclusões são as mesmas: na ampla maioria das curas realizadas, os Evangelhos afirmam que Jesus tocava nas pessoas.

Embora o Movimento Espírita brasileiro tenha uma forte natureza religiosa (a qual deve ser respeitada), mostra que desconhece os próprios Evangelhos, pois apregoa aos quatro ventos que Jesus permanecia parado à frente das pessoas com as mãos estendidas, quando em verdade ele se aproximava, tocava a pessoa e com unção afirmava: Eu quero, fica curado!

Graças a Deus, Jesus não tinha os espíritas para lhe lembrar que tocar é proibido, se bem que tinha os fariseus para lhe lembrar que não se devia curar aos sábados. De qualquer forma, vê-se em que estado se encontra o conhecimento dos espíritas acerca destes assuntos, ao ponto que já não se distingue mais a opinião do conhecimento, o mito da realidade, o fato histórico e documentado da criação ideológica.

Ainda pior, desta ideia falsa da história criam-se regras absurdas sobre as imposições de mãos, inventam-se teorias sobre a atuação do centro de força coronário, tudo em completo desacordo com as leis naturais reveladas pelo Magnetismo e pelo Espiritismo. 

Não há qualquer fundamento real, nem mesmo doutrinário, para sustentar a ideia de que Jesus apenas impunha as mãos e muito menos que também os espíritas devem se limitar a fazer o mesmo.

Em fluidoterapia, em Magnetismo, portanto, Kardec é um grande desconhecido e, por isto mesmo, os chavões e os achismos pululam como sapos e coelhos, multiplicando- se ao infinito.

Infelizmente, os espíritas ainda estão muito longe de perceber a riqueza e o imenso  atrimônio científico que dispõe a Doutrina Espírita e o Magnetismo no que diz respeito às curas. Presos a dogmas de fé, a comodismos vários e inconfessados, a ideologias estranhas ao corpo doutrinário, os trabalhos de fluidoterapia nas Casas Espíritas seguem à moda de fulano ou beltrano, esquecendo-se de convidar para os trabalhos do passe o próprio Allan Kardec.

É preciso que abandonemos as conveniências irrefletidas que cada um carrega dentro de si sobre o Magnetismo. Com reverência e modéstia, façamos um convite sincero e contrito para que nosso mestre Allan Kardec, em carne, osso e espírito, habite em nossas mentes e nos trabalhos de fluidoterapia.

Herculano Pires continuará sendo um referencial digno de consulta perante os espíritas por um longo tempo. Porém, quando tratou da origem dos passes é preciso considerar que o fez segundo suas crenças pessoais, próprio modo de ver. É uma opinião equivocada, tanto do ponto de vista doutrinário quanto histórico, mais uma neste imenso mar do Movimento Espírita.□

JORNAL VORTICE ANO VI, Nº 05 - Outubro - 2013


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